Por Athylla Borborema
A Vale, a segunda maior mineradora do mundo, enfrenta um novo processo por sua participação no rompimento da barragem de Mariana, o pior desastre ambiental do Brasil. Estas novas reclamações surgem após o fracasso de negociações para chegar a um acordo no Brasil, em dezembro de 2023, entre os proprietários da barragem de Mariana, Samarco, Vale e BHP, e o Governo Federal. Desta feita, a Vale, teve suas ações penhoradas, como forma de garantir que o dinheiro seja utilizado para pagar eventuais indenizações ao final do processo. O desastre é descrito como a pior tragédia ambiental da história brasileira e os efeitos são sentidos ainda hoje. A BHP irá enfrentar um julgamento de responsabilidade em outubro de 2024 no tribunal superior de Londres.
Mucuri, Conceição da Barra, São Mateus, Linhares e Aracruz foram os principais municípios do banco dos Abrolhos atingidos pela poluição, negligência e crimes ambientais – em 19 de fevereiro de 2025 acontece a primeira e principal instrução processual ou uma possível conciliação entre as partes. O processo foi aberto contra a Vale e a Samarco por causa de subsidiárias holandesas que atuavam com produção da barragem de Fundão.
Além das ações no Brasil e na Inglaterra, a tragédia de Mariana agora será levada aos tribunais da Holanda. O processo foi protocolado no país europeu por causa das subsidiárias holandesas: a Samarco Iron Ore Europe BV e a Vale Holdings B. Foi feito um pedido de indenização de R$ 18 bilhões em função dos prejuízos às mais de 77 mil pessoas atingidas, além de sete municípios, inclusive, Mucuri, cerca de mil empresas e associações e 20 instituições religiosas, decorrente do crime cometido na bacia do Rio Doce e no banco dos Abrolhos.
Mucuri no Litígio Ambiental
O banco dos Abrolhos, o gigante da fauna dos oceanos, compreende da foz do Rio Jequitinhonha, em Belmonte, até a foz do Rio Doce, em Regência, no município de Linhares. A tragédia de Mariana impactou diretamente 7 municípios litorâneos: Aracruz, Linhares, São Mateus, Conceição da Barra (ES), Mucuri, Nova Viçosa e Caravelas (BA) com a poluição dos rejeitos minerais que causaram amplos crimes ambientais, negligência no controle de segurança e violação da legislação brasileira, embora, somente Mucuri figura na ação no Tribunal de Amsterdã. Estes municípios estão no cérebro do banco dos Abrolhos que é o maior complexo coralíneo do Atlântico Sul com abundante biodiversidade de espécies marinhas e estruturas de corais com os maiores e mais diversos habitats da vida marinha.
Conforme o procurador-chefe da PGM – Procuradoria Geral do Município de Mucuri, Jhanshy Amarante Santos Teixeira, a ação judicial, assinada pelos escritórios Pogust Goodhead e Lemstra Van der Korst, já conseguiu a penhora dos ativos da Vale SA em sua subsidiária Vale Holdings B. O processo foi protocolado na justiça de Amsterdã por meio da Stichting Ações do Rio Doce, uma fundação sem fins lucrativos da Holanda.
Segundo o procurador geral Jhanshy Amarante, a primeira importante data do processo principal está marcada para 19 de fevereiro de 2025, quando haverá a instrução processual ou o devido acordo judicial, pois esta data corresponde ao prazo final antes do qual todos os anexos ao mandado de citação devem ter sido apresentados a Corte, embora, nessa mesma data, a Corte concederá aos réus um prazo padrão para apresentarem defesa.
Os 7 Municípios da Ação Holandesa
O procurador Dartaian Chaves Menezes, da PGM – Procuradoria Geral do Município de Mucuri, explica que o novo processo internacional, da ordem de R$ 18 bilhões, envolve atingidos no Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia. A Justiça da Holanda foi acionada em uma ação de 3 bilhões de Euros, o que representa 18 bilhões de reais contra a Vale e a subsidiária holandesa da Samarco (Samarco Iron Ore Europe BV). O novo processo envolve mais de 77 mil pessoas, sete municípios – nos estados do Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia -, cerca de mil empresas e associações e 20 instituições religiosas, nenhum deles integrantes do processo aberto em 2018 na Corte britânica.
O procurador do município Dartaian Menezes, ainda informa que um estudo feito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, divulgado em 2019, constatou que a lama da tragédia não só atingiu o Banco dos Abrolhos como também havia chegado até o mar da região do Arquipélago de Abrolhos, no Parque Nacional dos Abrolhos, com grande abrangência até a foz do Rio Mucuri, quando se identificou altos índices de metais pesados como zinco, cobre e ferro nas águas oceânicas de Mucuri. Os pescadores que entraram no processo alegam que tiveram suas atividades prejudicadas pela poluição que até hoje ainda impacta nos municípios atingidos pela tragédia ocorrida em novembro de 2015 e que polui com metais pesados uma das mais importantes bacias hidrográficas do país.
“Esta reivindicação é de extrema importância, pois visa reparar danos sofridos pelo território de Mucuri, e acreditamos que os recursos buscados serão utilizados para desenvolver importantes políticas públicas em nosso município, especialmente nas áreas da educação, turismo, saúde, bem-estar e meio ambiente”, salientou o procurador Dartaian Menezes, da Procuradoria Geral do Município de Mucuri. Os sete municípios brasileiros que estão figurando na ação holandesa, são: Sooretama, no Espírito Santo; Mucuri, na Bahia; e Ponte Nova, Iapu, Rio Casca, Antônio Dias e Gonzaga, em Minas Gerais.
A tragédia de Mariana
No dia 5 de novembro de 2015, a barragem do Fundão, em Mariana (MG), se rompeu no distrito de Bento Rodrigues, a cerca de 35 Km do centro da cidade. O volume de rejeitos, que formavam uma lama tóxica, atingiu todo leito do Rio Doce e correu até o Oceano Atlântico, afetando cerca de 230 cidades de Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia. Com o rompimento, 19 pessoas morreram, mas os danos ambientais foram considerados como a maior tragédia da história do país. De Mariana, na região central de Minas Gerais, até o balneário de Regência, no município de Linhares, no litoral norte do Espírito Santo, em um intervalo de 20 dias, a lama da barragem da Samarco que se rompeu percorreu 826 quilômetros até se despejar no mar.
Após a tragédia ambiental, dois processos principais foram abertos no Brasil. O primeiro, dos governos de Minas Gerais e do Espírito Santo contra as empresas, gerou um acordo judicial para reparação com indenizações e reassentamentos através de 42 programas. Para essa execução, a Vale criou a Fundação Renova, para que cerca de R$ 33 bilhões fossem pagos.
Havia expectativa de que as instituições de Justiça no Brasil, juntamente com os governos estaduais e federal, pudessem chegar a um acordo justo com as mineradoras que contemplasse todas as vítimas do rompimento – incluindo os municípios e os indivíduos, mas as conversas fracassaram em dezembro de 2023, pois enquanto as autoridades e os governos pediram R$ 126 bilhões, a Vale, Samarco e BHP propuseram R$ 42 bilhões e, ainda não há expectativa de resolução.
Além disso, outra ação, movida pelo Ministério Público, continuou tramitando no tribunal. No dia 12 de março de 2024, a Justiça Federal condenou as empresas a um pagamento de R$ 47,6 bilhões em indenização coletiva, a serem corrigidos por juros. Essa foi a primeira decisão de mérito de dimensão global que já foi proferida no processo.