Dois inquéritos no MP investigam denúncias sobre obras de Frans Krajcberg e retirada de esculturas por caminhões em Nova Viçosa

Cara, cadê nosso museu? Bahia recebe doação de acervo, mas descumpre acordo

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Dois inquéritos no MP investigam denúncias sobre obras de Frans Krajcberg e retirada de esculturas por caminhões em Nova Viçosa

Reportagem do jornalista Moysés Suzart – Jornal CORREIO/Salvador

Imagine a Bahia com um museu artístico e ecológico em plena mata atlântica litorânea no extremo sul do Estado, um lugar de múltiplos encontros e manifestações culturais, próximo de uma natureza singular e com obras do artista mundialmente conhecido Frans Krajcberg espalhadas pelo lugar. Não imagine, pois este lugar deveria existir desde 2009, quando o próprio escultor doou toda sua obra para o Governo do Estado, que em contrapartida faria este museu, mas que não passou de promessa. No local que deveria ser o museu, no Sítio Natura, em Nova Viçosa, apenas caminhões entram e saem levando toda obra para outros lugares e exposições, esvaziando o sonho do artista que utilizava suas esculturas para denunciar o desmatamento das florestas no Brasil em proteção do planeta.

Frans Krajcberg ficou conhecido no mundo inteiro ao retratar a destruição da natureza em suas obras, muitas delas com madeiras retiradas de áreas desmatadas ou queimadas. Ele morreu em 15 de novembro de 2017, aos 96 anos, sem esconder a tristeza de não ver concretizado este presente aos baianos. E arrependido também. “Não tenho ajuda, nunca tive ajuda do Estado da Bahia. Tudo que eu podia fazer para sobreviver, eu fiz. O Estado da Bahia ultimamente não me dá nem bom dia. Que tristeza. Eu me pergunto se o museu será feito… Eu faço tudo que posso fazer, sem ajuda e sem bom dia. Eu fico triste em ver a decadência cultural no Brasil. Não tenho mais confiança com o Estado da Bahia. Nem bom dia recebo”, disse Krajcberg, em depoimento gravado em 2016, um ano antes de sua morte.

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Sem herdeiros, o artista e ativista decidiu doar toda sua obra para o Estado, em 2009. São mais de 48 mil itens (entre esculturas, fotografias e pinturas), que ainda estão em processo de catalogação. O espólio também não é conclusivo. Existe um documento preliminar que aponta pelo menos 495 esculturas de madeira, suas principais obras de valores inestimáveis. Foi doado também o próprio Sítio Natura. O local com faixa de praia tem o total de 48 hectares, a maioria de mata fechada e manguezal, que também abriga sua antiga morada, uma casa na árvore projetada pelo o arquiteto e paisagista Zanine Caldas. Segundo corretores de imóveis da região, cada hectare vale cerca de R$ 400 mil, em razão do local privilegiado à beira-mar e as margens da BA-001.

Foi assinado naquele ano uma escritura pública de doação, em que o poder público, caso aceitasse a doação, deveria cumprir algumas obrigações. Se não quisesse, o acervo seria destinado a outro estado brasileiro, mas sem especificar qual poderia ser. Não seria difícil encontrar interessados. “A importância da obra de Krajcberg é tão grande que qualquer país do mundo gostaria de tê-la, exibir e conservar este privilégio que a Bahia tem e não está dando o devido cuidado. É necessário que o Governo do Estado assuma esta responsabilidade”, disse o artista plástico Juarez Paraíso, membro da ALB – Academia de Letras da Bahia e professora Emérito da UFBA.

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Mesmo assim, o termo foi assinado pelo Estado, aceitando todos os encargos, incluindo a construção imediata do museu: “No prazo de 150 dias, a contar da data do registro da presente escritura, o Estado da Bahia assumirá a execução das obras de conclusão das instalações do Museu Artístico e Ecológico situado no Sítio Natura, em Nova Viçosa”, diz o documento. Mesmo com este pedido taxativo, foi completamente ignorado pelo IPAC – Instituto do Patrimônio Artístico Cultural da Bahia, órgão do estado responsável pelo lugar e vinculado à Secretaria de Estado da Cultura. O senador Jaques Wagner (PT) era o governador da Bahia na época.

“Frans Krajcberg e sua obra são patrimônios mundiais. Assim como há um trabalho desenvolvido em Nova Viçosa, é importante que parte de sua arquitetura da natureza esteja, neste momento, exposta no Museu Brasileiro da Escultura e da Ecologia, em São Paulo. Essa exposição, por sinal, integra o projeto de preservação, conservação e divulgação do acervo e do Sítio Natura, cedido pelo artista ao Governo da Bahia. Então, sigo com sonho de que as atuais e futuras gerações tenham acesso ao legado e à história de Krajcberg, [seja] em Nova Viçosa, em Salvador, em toda Bahia, no Brasil e no mundo”, disse Jaques Wagner, por meio de sua assessoria.

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Em julho de 2017, oito anos após a doação, o então secretário da cultura, Jorge Portugal, chegou a visitar Krajcberg e se comprometeu em conversar com o governador do estado, Rui Costa (PT), sobre a construção do museu. Houve a consagração inclusive, em fazer mais um museu em Salvador, no zoológico da cidade, em Ondina ou em uma outra área no Parque Metropolitano de Pituaçu, onde Frans Krajcberg já tinha visitado anteriormente. Não adiantou. Portugal pediu exoneração dois meses depois e, em novembro, Krajcberg morreu no Rio de Janeiro e o Sítio desde então ficou abandonado.

Em 2019, o Jornal Folha de São Paulo chegou a visitar o Sítio Natura e denunciou o abandono do lugar, com obras quebradas, infiltrações, além de cupins e brocas ‘comendo’ as obras. Na época, o diretor geral do IPAC, João Carlos Cruz, já admitia que o órgão não tinha intenção de construir o museu no lugar, apesar de assegurar que estava dando manutenção e aguardava os resultados dos processos licitatórios em andamento. Em abril de 2022, o caso ganhou mais um capítulo que virou dois inquéritos no Ministério Público Estadual. Moradores de Nova Viçosa passaram a registrar uma grande quantidade de caminhões frequentando o Sítio Natura, a vigilância da Polícia Militar foi retirada do turno da noite e uma equipe reduzida permanece apenas o dia sob o auxilia de uma empresa de vigilância armada.

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Entrada do Sítio Natura, onde deveria ter um museu ecológico desde 2009. Dentro, caminhões retiram obras de Krajcberg

No último dia 11 de maio, moradores de Nova Viçosa denunciaram a entrada de sete caminhões baús no Sítio Natura, levando algumas obras de Frans Krajcberg sem aviso prévio e destino. Até um tronco de madeira que decorava a casa do artista foi retirado. No final de abril, outros caminhões também retiraram mais obras, desta vez como forma de empréstimo para uma exposição no Museu Brasileiro da Escultura e da Ecologia (MuBe), em São Paulo, que celebra o centenário do artista, comemorado em 2021.

O espólio de Krajcberg, sob responsabilidade do advogado e inventariante do artista, Ernani Griffo Ribeiro, ainda tentou na justiça impedir a saída indiscriminada das obras, mas o pedido cautelar foi negado pelo juiz substituto da comarca de Nova Viçosa, Guilherme Vitor de Gonzaga Camilo, sob alegação que o Estado tinha a tutela das obras e poderia fazer o empréstimo para o MuBe. Com a liberação judicial, 106 obras de arte seguiram para São Paulo, onde ficarão em exposição até agosto deste ano, incluindo três carcaças de baleia que faziam parte da paisagem fixa do sítio e não são consideradas esculturas do artista polonês. Mesmo assim, seguiram viagem.

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A Flor do Mangue: uma das principais obras do artista hoje está emprestada para exposição em São Paulo. O valor da obra é inestimável.

Por meio de nota, o IPAC diz que o Governo do Estado só teve poderes sob a doação de Frans Krajcberg após sua morte, em 15 de novembro de 2017, mas contratempos, como a pandemia (iniciada em 2020), impediram a construção do museu. “A doação foi realizada pós mortem, portanto, pós 2017, e neste hiato houve o processo de pandemia. Equipamento para Acervo só se faz com reconhecimento de sua total potencialidade. Portanto, o IPAC está em processo de desenvolvimento do projeto dos equipamentos necessários no Sítio Natura, em Nova Viçosa”, declarou o IPAC. Pedimos para falar com o diretor geral da autarquia, João Carlos Cruz, mas não obtivemos retorno.

O argumento do IPAC é questionável. O Governo tinha a obrigação de fazer o museu no ato da doação, em 2009. O gozo pleno do acervo, sim, seria de exclusividade estadual após morte do artista, que tinha usufruto do lugar enquanto estivesse vivo. O IPAC não mencionou quando ou se o museu finalmente será entregue como prometido, mas explicou sobre as recentes saídas de obras de arte de Krajcberg. Segundo o órgão, as obras foram para o Museu do Recôncavo Wanderley Pinho, em Candeias, onde só agora serão restaurados e passarão por procedimentos de higienização e descupinização do acervo, já que boa parte é feita de madeira. O restaurador Stephan Schafer está acompanhando todo o processo, segundo o IPAC.

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Uma das baleias de Frans Krajcberg sendo retirada para exposição em São Paulo. Elas deveriam permanecer em Nova Viçosa, segundo denúncias feitas ao MP.

O Governo do Estado ainda deveria “manter a afetação dos bens doados para fins ecológicos e culturais, promover medidas de visitação do museu, transformar a casa em planetário de múltiplos encontros, manter os imóveis como modelo de preservação, preservar a memória do artista e não destinar as doações para fins particulares”. Estes encargos também foram ignorados.

Em 2020, dois meses antes da pandemia, o Estado assinou um acordo de empréstimo de 12 obras de Frans Krajcberg para a Fundação Baía Viva, que gere o Cerimonial Loreto, espaço particular de festas na Ilha dos Frades, em Salvador. Esta medida estava expressamente proibida pelo artista no termo de doação, mas chegou a ser liberada pelo próprio João Carlos Cruz. Procuramos a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia para esclarecimento, mas fomos informados que apenas o IPAC responde pelo acervo. As obras, segundo inquérito do MP, não chegaram a ser emprestadas. A Fundação Baía Viva confirmou que nunca chegou a receber as esculturas.

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Um projeto para construção do museu chegou a ser desenhado e entregue ao Estado.

Além do termo de doação, Krajcberg também deixou um testamento em que dá mais detalhes sobre as obrigações do Estado e os limites do usufruto das obras. Nas cláusulas, o artista deixa claro que todas as obras doadas fossem colocadas no Sítio Natura, além de uma parceria com o museu Krajcberg de Paris, que ainda não aconteceu. Caso abrisse um museu em Salvador (que também deve ter o seu nome), algumas obras poderiam até ir para a capital, mas sem deixar desguarnecida a sede em Nova Viçosa, onde ele deixa claro a obrigação de ser a matriz de tudo.

Todas estas incertezas levaram à instauração de dois inquéritos do Ministério Público com intuito de investigar a conduta e falta de cumprimento dos encargos pelo Ipac, ambos denunciados pela jornalista e documentarista Renata Rocha, que prefaciou vários livros do artista e produziu filmes memoráveis sobre a vida e a obra de Frans Krajcberg.

“O IPAC está dizendo que fiz denúncias infundadas. Se fosse infundada, elas não seriam transformadas em dois inquéritos? O IPAC tem interesse em distribuir as obras pelos lugares e está esvaziando o museu. Estamos correndo o risco de perdermos o controle destas obras. É por isso que denunciei”, disse Renata Rocha, que denunciou o suposto esvaziamento do museu, o descontrole na saída das obras, objetos que ainda não foram catalogados pelo IPAC e até derrubadas de árvores no Sítio Natura. Para Renata, o Governo não cumpriu os termos e obrigações deixados pelo artista como condição para a doação.

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“Eles [IPAC] falam de 48 mil itens doados, mas não dizem o que é. Krajcberg tem uma coleção de Franco Terranova, que o próprio artista doou para ele e vale uma fortuna. Era para estar lá no museu. Está? Ninguém sabe. O museu tem móveis de Zanine Caldas, esculturas xingus, azulejaria, não vi nada disso na catalogação preliminar. O Estado precisa responder onde estão”, questiona Renata Rocha.

A promotoria de justiça do caso alegou que o IPAC explicou sobre as retiradas do acervo, mas ainda não foi claro sobre a demora na criação do museu. Também alegaram ao Ministério Público Estadual que havia uma deterioração das obras e era preciso uma retirada imediata, pois as esculturas estavam infestadas de cupins e as instalações em Nova Viçosa estavam inapropriadas, com muita umidade, infiltrações e risco iminente de incêndio.

“O que o Ministério Público busca é a efetividade do cumprimento do testamento. Lá está claro que o Sítio Natura deve ser um museu ecológico e nós não temos ainda uma posição do IPAC em relação ao que será feito, tampouco cronograma de execução do desejo do artista de ter o museu em Nova Viçosa. Será o próximo passo da apuração. Faltou comunicação deles sobre a retirada das obras, mas foi explicado. Mas está claro que extrapolou o prazo [do museu], muito além do esperado, que deveria ser 150 dias após a doação [2009, no caso]”, explica um dos promotores do caso, Fábio Fernandes Corrêa.

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Frans Krajcberg em 6 de março de 2008 recebendo o Título de Cidadão Baiano das mãos do governador Jaques Wagner, autor da sugestão junto a ALBA.

O promotor ainda explica que o Estado pode perder a doação. “Creio que não seja o desejo de ninguém, mas é possível a anulação da doação, sim. O Governo da Bahia é detentor das obras e pode gerir da melhor maneira a conservação do acervo e promovendo as obras, como exposições fora. Mas não se pode perder de vista o desejo do artista de que Nova Viçosa contemplasse o museu. Qualquer tipo de testamento com encargo prevê a consequência. E na doação ele fala sobre a transferência das obras para outro estado. O MP vai agora buscar que se cumpra os encargos”, completa o promotor Fábio Fernandes.

A Promotoria Regional de Justiça Especializada em Meio Ambiente, com sede em Teixeira de Freitas, detentora de um dos inquéritos, pediu algumas explicações ao IPAC e ao Instituto Pedra, empresa que está auxiliando na recuperação e catalogação do acervo, que deverão ser respondidas em até 30 dias. O MP solicitou a planilha dos valores em dinheiro, além dos bens móveis e imóveis deixados pelo artista. Também solicitou explicações sobre as derrubadas de árvore e supostas autenticações e falsificações de obras de Frans Krajcberg. Sobre as derrubadas de árvores, o MP cobrou explicação também à Prefeitura Municipal de Nova Viçosa, que fez buscas no lugar e constatou, de fato, áreas devastadas, como consta nos autos do inquérito, mas sem encontrar culpados.

Para o IPAC, as denúncias no Ministério Público são infundadas e há um interesse pessoal por parte da jornalista Renata Rocha, que teve uma relação afetiva com Kraisberg durante sete anos, entre 2009 e 2016. “É importante ressaltar que algumas matérias jornalísticas que relatam denúncias tiveram também como fonte terceiros ‘interessados’, perfazendo um ciclo de informações caluniosas no intuito de defender anseios pessoais e escusos. (…). No bojo das diversas denúncias está sobreposto o interesse privado e pessoal: o Espólio teve contra si ajuizada Ação de Reconhecimento de União Estável post mortem, tendo a autora a Srª Renata Rocha Silva”, disse a nota do órgão, com 15 páginas.

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O jornalista e escritor Athylla Borborema (autor da biografia “Frans Krajcberg – O poeta da árvore”) ao lado do memorial fúnebre de Frans Krajcberg onde suas cinzas estão depositadas no tronco da Casa da Árvore no Sítio Natura, em Nova Viçosa.

Renata se defende. “Sobre meu pedido de reconhecimento de união estável, ao contrário do que o Governo da Bahia divulga, numa grotesca e desrespeitosa tentativa de desqualificar o que realmente importa, que é as minhas críticas às ações predatórias ao acervo do artista Frans Krajcberg. O meu pedido junto à justiça não diz respeito a qualquer tentativa de me apresentar como herdeira, ou intenção patrimonialista do espólio do artista”, disse Renata, que completa: “minha preocupação é saber onde está o controle destas obras. O que está saindo? E o museu? Não tem mais ninguém do inventário lá no sítio, o IPAC tirou todos. Ninguém fala nada”, completa.

Voltemos ao testamento. Além dos encargos, Krajcberg ainda constituiu uma comissão para “cuidar e zelar conjuntamente com o legatário dos bens deixados”, como consta no testamento. Foram cinco membros mencionados no testamento, cada um com uma responsabilidade específica, mas atualmente sem função, já que não existe museu. Um destes nomes é Ernani Griffo Ribeiro, testamenteiro do espólio já citado. Ele chegou a tentar impedir a retirada das obras para a exposição de São Paulo, mas teve o pedido indeferido, como já citamos.

Dona de uma galeria de artes no Rio de Janeiro, Márcia Barrozo também faz parte desta comissão e sua função seria promover o museu. Como ainda não existe o espaço, Barrozo disse ter ciência da retirada das obras para a exposição em São Paulo, mas se mostra preocupada com o abandono do Sítio Natura.  “A retirada das obras é temporária, foi feita pelo MuBe. Desconheço a retirada de outras obras, espero que seja para melhorar as condições do Sítio Natura, que no momento são péssimas.  Só o IPAC, o verdadeiro proprietário das obras do Sítio Natura e de outras propriedades de Krajcberg, poderá esclarecer esta questão”, escreveu, via mensagem de texto. Barrozo ainda promete uma visita à antiga morada do artista em breve.

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O jornalista Athylla Borborema autor do livro “Frans Krajcberg – O poeta da árvore”, uma biografia 100% dedicada a vida e a obra do escultor – na foto, ao lado de Krajcberg no aniversário de 96 anos do artista.

O inquérito também investiga uma suposta saída de esculturas para a galeria de Barrozo dias antes da morte de Krajcberg, o que ainda está sendo apurado, mas consta na denúncia de Renata Rocha, que assegura ter documentação de tudo e faz denúncias graves denominando nomes. Renata conta que, quando foi visitar o artista no hospital, outro membro da comissão, ajudante de Frans, teria ido até o Sítio Natura buscar algumas peças.

“Em visita ao artista Frans Krajcberg, no Hospital Samaritano no Rio de Janeiro em 2017, encontrei Oraldo do Nascimento Costa, na UTI. Ele me disse que iria retornar a Nova Viçosa no dia seguinte (…). Ao questionar a ele o motivo da ida a Nova Viçosa, Oraldo respondeu que ele iria buscar obras de arte para Marcia Barrozo do Amaral”, declara Renata, anexado na investigação. O escultor Oraldo do Nascimento Costa, foi funcionário do artista nos seus últimos 20 anos de vida, além de ter mantido uma relação de amizade e cumplicidade entre os dois. Já Márcia Barrozo não respondeu mais quando perguntamos sobre o envolvimento do seu nome no Inquérito. A escultora, pintora, marchand e galerista carioca Márcia Barrozo do Amaral, por cerca de 30 anos foi a pessoa quem organizava as exposições de Frans Krajcberg e comercializava suas obras de artes a partir do Rio de Janeiro.

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Atual estrutura do museu deixada pelo artista no Sítio Natura.

O caso parece não ter fim. Existe até um laudo técnico, assinado por alguns especialistas como Juarez Marialva Tito Martins Paraiso, atestando o plágio. “Lembro deste laudo. Junto com outros especialistas, chegamos à conclusão que houve um plágio, sim. Mas não disse que era uma intenção criminosa, pois isso não cabe a mim. Fiz o laudo técnico. A obra de Krajcberg é única e ímpar, com uma visão muito pessoal. Difícil termos uma obra igual a dele”, disse Juarez Paraíso.

O policial militar Carlos Roberto Magalhães Monteiro, que há 14 anos chefiou a segurança de Frans Krajcberg e com ele manteve uma grande relação de confiança, passou a produzir esculturas bem semelhantes ao trabalho do polonês e que fez parte da segurança do Sítio até abril de 2022, se defende alegando não se tratar de plágio, mas uma releitura da obra. “Com relação ao que está acontecendo no museu, não sei lhe responder. Você pode manter contato com o inventariante [Ernani Griffo]. Ele pode falar sobre o assunto. [Sobre as obras], sempre foi o meu sonho fazer brotar a semente plantada em minha vida pelo seu Frans. Ele sempre me dava raízes, galhos, troncos e pigmentos para que eu pudesse dar vida”, disse Magalhães, alegando ter aprendido com o próprio Krajcberg a fazer arte nos troncos de árvore. O curioso é que as obras, segundo o inquérito, estariam autenticadas pela antiga secretária do artista, a administradora Marlene Figueiredo Gonçalves, que foi a secretária direta do escultor e gerente dos seus negócios pelos últimos 13 anos de vida. Ela disse ao Correio, que preferia não falar sobre as polêmicas.

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O cenário da Casa da Árvore e o carro do artista ainda permanece em baixo.

Desde o último dia 16 de maio o Brasil comemora a 20ª Semana Nacional do Museu, quando diversos estabelecimentos espalhados pelo país promovem ações de incentivo e importância destes instrumentos de preservação, conservação, educação e história. Na Bahia, além de universidades e fundações, 22 museus baianos estão com programações especiais até este domingo (22/05), mas bem que poderiam ser 23 museus. Para especialistas, o amor de Frans Krajcberg pela Bahia custou caro para suas obras.

“Eu acho, pessoalmente, que foi muita identificação de Krajcberg pelo lugar que ele viveu por 45 anos para fazer esta doação. A Bahia não é o melhor lugar para se tratar de parques ecológicos e museus. Os museus vivem uma penúria financeira imensa, com problemas sérios que comprometem até suas aberturas. Creio que, se Krajcberg tivesse ouvido pessoas da área, ele teria doado isto para outro estado ou mesmo para outro país”, diz Luiz Alberto Ribeiro Freire, professor da Escola de Belas Artes da UFBA e doutor em História da Arte pela Universidade do Porto, em Portugal.

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Réplica da casa da árvore produzida pelo escultor Everaldo Paranaguá Costa, que trabalhou por 6 anos com Krajcberg.
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